Introdução
Com o objectivo de descrever os Direitos Humanos em
Moçambique, desde a sua conceptualização sociológica até a entidade que tem por
vocação promover e protegê-los, é elaborado o presente artigo para a elucidação
cada vez mais do cidadão, sobre o papel da Comissão Nacional dos Direitos Humanos
e do Serviço Nacional Penitenciário no combate a tortura, tratamentos cruéis e
ou desumanos e a valorização da dignidade humana em instalações penitenciarias
em Moçambique.
A Génese dos
Direitos Humanos
De todos os objectivos que os Direitos Humanos pretendem
alcançar estão por detrás as piores acções humanas já registadas no século XX,
e todos interligam-se às barbaridades das guerras mundiais. Este factor pode
ser considerado o fulcral, pois que emergiu muitos apátridas pelo mundo e que
pela sua condição já não tinham nenhuma protecção, não beneficiavam de
reconhecimento como cidadãos, nem como detentores de direitos. Há também a
ideia de que os Direitos Humanos surgem na perspectiva da construção dum mundo
com novos alicerces ideologias, caso da paz mundial.
Os Direitos Humanos já haviam encontrado concretização
no Pacto da Sociedade das Nações, que conduziu, inter-alia, à criação da Organização Internacional do Trabalho. Na
Conferência de S. Francisco de 1945, reunida para redigir a Carta das Nações
Unidas, foi apresentada uma proposta no sentido de ser redigida uma declaração
dos direitos fundamentais do homem, proposta que não foi examinada por exigir
um estudo mais atento do que aquele que era, à data, possível. Dai a Carta Internacional
dos Direitos Humanos que fala claramente em promover
e estimular o respeito pelos direitos do homem e pelas liberdades fundamentais
para todos., e foi mesmo através da resolução 217 A
(III), de 10 de Dezembro de 1948, em Paris, que surgiu a Declaração Universal
dos Direitos Humanos (DUDH), constituindo o primeiro instrumento dos
instrumentos previstos que contou com nomes como John P. Humphrey do Canadá,
Rene Cassin da França, P. C. Chanz da China, Charles Malik do Líbano, Eleonor
Roosevelt dos EUA, entre outros.
A DUDH considera que o reconhecimento da dignidade
inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e
inalienáveis é o fundamento de três elementos cruciais para o bem-estar da
sociedade: a liberdade, a justiça e a paz no mundo. A efectivação desses
elementos constitui em um indicador de que a respectiva sociedade caminha na
direcção de um mundo emancipatório, como afirma Boaventura de Sousa Santos que
os direitos humanos constituem-se em alicerces suficientes para a emancipação
social dos indivíduos.
Para Santos (sd),
enquanto os direitos humanos forem concebidos universais, tenderão a operar
como localismos globalizados, constituindo sempre um instrumento de choque
entre civilizações, ou como sugere Samuel Huntington (1993), como arma
ocidental contra o resto do mundo (the west against the rest). Na perspectiva
de Santos, para contrariar este sentido dominador, há uma necessidade dos
direitos humanos serem reconceptualizados como multiculturais.
Reconhece ainda a DUDH que o desrespeito pelos
Direitos Humanos resulta em actos bárbaros que ultrajam a consciência da
humanidade e o advento dum mundo em que todos gozem de liberdade de palavra,
crença, etc. Que os direitos humanos sejam protegidos pela lei, para que o ser
humano não seja compelido, como último recurso.
Os Direitos
Humanos em Moçambique
Em Moçambique existe a Comissão Nacional dos
Direitos Humanos (CNDH), que segundo a lei nr 33/2009 de 22 de Dezembro, surge
pela necessidade de estabelecer mecanismos para o reforço do sistema nacional
de promoção, protecção, defesa e melhoria da situação dos cidadãos sobre
direitos humanos em Moçambique.
É uma instituição de direito público e que goza de
autonomia administrativa e funcional em relação aos demais órgãos do poder
central e local do Estado. A sua função consiste, segundo o Artigo 5º, de forma geral,
em promover e proteger os Direitos Humanos no Pais. Significando que todos
cidadãos que se encontram com Direitos Humanos violados podem se aproximar da CNDH
apresentar o direito violado, e esta entidade, por sua vez, desenvolve acções
administrativas com vista a uma assistência jurídica a cidadãos financeiramente
desvanecidas, ou seja, coordenada acções administrativas visando a reposição dos
danos pela tal violação.
O Departamento de Pesquisa, Monitoria e Avaliação,
estrutura do Secretariado da CNDH, através da deliberação N.º 03/CNDH/2015, no seu Artigo 13º, tem por função o
mapeamento de todas as entidades públicas e privadas, nacionais e
internacionais relevantes para as acções de pesquisa, monitoria e avaliação da
situação dos Direitos Humanos. Diante desta função há uma necessidade de
coordenar esforços contínuos no sentido de formar e monitorar
activistas-pesquisadores permanentes em Penitenciárias para estudarem e colaborarem
na avaliação do ambiente e quotidiano dos reclusos para perceber até que ponto
os Direitos Humanos estão sendo violados de forma manifesta e ou
lactente, e relatar à CNDH.
A violação dos Direitos
Humanos, visto como uma acção social, pode ser interpretado
a partir de Weber (2004), como sendo aquela em que pode não se mostrar no hoje e no aqui, isto é, que uma
atitude administrativa e ou instrumento legislativo pode se manifestar como se
o objectivo fosse o previsto, enquanto o lado manifeste, ou mesmo a outra face da moeda se encontra em
repouso a espera da sua manifestação, culminando com a violação dos Direitos
Humanos.
Portanto, as acções da CNDH bem como
do Serviço Nacional Penitenciário (SERNAP) devem ser acções coordenadas,
demonstrando sim que são entidades que tem mesmas origens, o Ministério da
Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos. Que só assim o bem-estar social
poderá constituir-se num indicador suficiente para a justiça em Moçambique, bem
como no sucesso da promoção e defesa de Direitos Humanos. Por outra, os activistas-pesquisadores precisam estar em
constante colaboração com os funcionários do SERNAP, de modo que na manutenção da segurança
interna das prisões, e como sendo um serviço público, garanta-se a execução das
decisões judiciais reconhecendo que o cidadão condenado embora nessa qualidade,
tem direitos e que são defendidos por muitos instrumentos nacionais e
internacionais em que Moçambique é signatário.
O
SERNAP, deve garantir e velar, por sua vez, pelo respeito dos Direitos Humanos no tratamento da população penitenciária e
dos que cumprem a pena em regime de liberdade. Isto significa que, em respeito
à Constituição da Republica de Moçambique (CRM), no seu Artigo 11º, é dever
dos funcionários do SERNAP colaborar na defesa dos direitos humanos da população que se encontra a
cumprir suas penas, e em reconhecimento de várias convenções e ou pactos.
Caso da Carta Africana dos
Direitos Humanos e dos Povos, onde a dignidade humana constitui num dos
objectivos essenciais para a realização das legítimas aspirações dos povos africanos
(Artigo 5º). Nesta perspectiva, contrariam o princípio da
dignidade humana, actos como passar fome e dormir ao relento conforme Barroso
(2000), bem como a falta de alimentação, da saúde e da educação, conforme Torres
(1995).
E
dignidade humana deve ser compreendida na esteira de Sarlet (2001), como a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano
que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da
comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres
fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho
degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais
mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação
activa co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão
dos demais seres humanos. Portanto, o princípio da dignidade da pessoa humana impõe um
dever de abstenção e de condutas positivas tendentes a efectivar e proteger a
pessoa humana, independentemente da sua condição de recluso.
Caso
também do Protocolo Facultativo a
Convenção Contra a Tortura e Outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou
Degradantes, onde reafirma-se que a tortura e outras penas ou tratamentos cruéis,
desumanos ou degradantes são proibidos e constituem graves violações dos Direitos Humanos (Artigo 40º da CRM, Artigo 5º da Carta Internacional dos Direitos do Homem, Artigo 7º do Pacto Internacional sobre os
Direitos Civis e Políticos que acrescenta que é interdito submeter uma pessoa a uma experiência médica ou científica sem o
seu livre consentimento). Em que tortura ou tratamento desumano ou degradante inclui actos como
espancamento, choques eléctricos, suspensão pelos braços ou pernas, assalto
sexual, violação ou ameaça de violação ou assalto sexual, execuções, etc.
A Convenção Contra Tortura, adoptada pelas Nações
Unidas, define tortura como constituinte de um acto através do qual é infligida
a uma pessoa dor severa ou sofrimento, quer físico quer mental, com o objectivo
de obter dessa pessoa informação ou confissão, puni-la por acto que a mesma
cometeu ou que se suspeita que tenha cometido, intimidar ou coagi-la por
qualquer razão baseada em qualquer tipo de descriminação.
Para o combate a tortura, tratamentos cruéis e ou
desumanos e a valorização da dignidade humana em instalações penitenciárias em
Moçambique, a CNDH e o SERNAP tem por opção o reforço de laços fortes, para além
daqueles que já existem, e que venham a criticarem-se mutuamente de forma a
melhorar a situação dos Direitos Humanos nas penitenciárias. Bem como a
universalização dos Direitos Humanos,
onde a filosofia tem de se
generalizar a si própria, enraizando a universalidade do seu saber no solo da
essencialidade dos reclusos, funcionários do SERNAP, e
activistas-pesquisadores. Em termos concretos, isso significa que todos estes
intervenientes terão de ler, além dos textos filosóficos do ocidente, os textos
de outras culturas e promover todos os textos em que as possibilidades da realidade
manifestem o seu sentido, ou melhor, em prol do bem-estar social
universalizado.
Há também a necessidade da inclusão de outro, que na
perspectiva de Habermas (2002), se manifeste em uma relação
interdependentemente duma tríade de elementos, onde os funcionários do SERNAP
não vistam fronteiras para com os reclusos, bem como com activistas-pesquisadores no decorrer do seu
dever. Devendo que se interiorize a perspectiva humanista no seio não só da
tríade, e para que as fronteiras sejam abertas entre toda a comunidade que
legalmente tenciona um bem-estar social e digno dos reclusos em respeito dos
Direitos Humanos em Moçambique
Considerações
finais
A CNDH, entidade moçambicana que tem por vocação a
defesa e promoção de Direitos Humanos precisa investir no seu pessoal,
transformando-o em agentes activos e não defensores de sistemas corruptos e que
violam sistematicamente os Direitos Humanos em Moçambique. Nesta perspectiva os
laços com o SERNAP são de extrema importância, bem como com outras entidades de
serviço público.
Há ainda a necessidade da CNDH estreitar sua cooperação
com os canais de informação, os media,
de forma que haja transparência sem burocracias quanto a entidades públicas
violadoras de Direitos Humanos, podendo enveredar esforços para a existência dum
Departamento de Comunicação, que mantenha contactos permanentes com a media para, de forma latente, educar as
entidades públicas e seus funcionários sobre actos de violação de Direitos
Humanos através da publicitação de factos e reportagens que constituam graves
ou leves violações dos Direitos Humanos em Moçambique.
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