Introdução
Num olhar supérfluo, a cidadania moçambicana não se
sente agredida pelo fenómeno da corrupção na esfera pública, pois que, em
alguns momentos mergulha de forma voluntaria no sistema de corrupção,
alcançando apenas fins singulares, lesando fins colectivos. Esta atitude coloca
em causa a essência duma cidadania que promove e defende os direitos humanos.
Neste artigo, vamos tecer reflexões averiguadas nas cidades de Maputo e Matola em volta desta tríade de conceitos,
cidadania moçambicana, cultura de corrupção e direitos humanos.
A tríade dos
conceitos
Numa
concepção romana deve se perceber que o termo Cidadania, deriva da palavra ciuis.
Em latim, a palavra ciuis gerou ciuitas, “cidadania”, “cidade”, “Estado”. Assim, Cidadania é uma
abstracção derivada da junção dos cidadãos. Ciuis
é o ser humano livre e, por isso, ciuitas
carrega a noção de liberdade em seu centro (FUNARI, 2003). Ainda na mesma
perspectiva importa ressaltar que no sentido moderno, cidadania é um conceito
derivado da revolução Francesa (1789), para designar um conjunto de membros da
sociedade que têm direitos e decidem o destino do Estado.
Através
destas noções pode-se indagar a existência ou não da Cidadania em Moçambique.
Para Covre (1998), só existe cidadania
se houver a prática da reivindicação, da apropriação de espaços, da pugna para
fazer valer os direitos do cidadão. Nesse sentido, a prática da cidadania pode
ser a estratégia, por excelência para a construção de uma sociedade melhor.
Mas, o primeiro pressuposto dessa prática é que esteja assegurado o direito de
reivindicar os direitos, e que o conhecimento deste se estenda cada vez mais a
toda a população.
Em Moçambique, embora haja intimidações políticas
estratégicas verifica-se vindícias, mas que seu impacto não merece consideração
política no que diz respeito a concretização da vontade dos cidadãos. Esta não
concretização demonstra que a cidadania em Moçambique é limitada. Não só
através de vindícias publicas se manifesta a cidadania, como também através do
combate para fazer valer os direitos do cidadão. Este combate tem se mostrado
outro caso que resulta em fracasso, visto que moçambicanas precisam ir dar luz
na maternidade com algum valor no nó da capulana. Como também, grande parte dos
servidores públicos mostram que se deve molhar a mesa para que seja garantido o
serviço público a tempo e com eficiência paga.
Este espírito de algum valor no nó da capulana e de
molhar a mesa também tem sido demonstrado do lado do cidadão, este que
justifica-se por não ter muito tempo de espera, falta de vontade de formar
fila, demonstração de posse de poder e ou de status, etc. Este espírito do cidadão mina a verdadeira cidadania,
bloqueia a eficiência dos serviços públicos, ofende os direitos humanos e
direcciona a Cidadania a um mundo dos serviços públicos totalmente capitalista.
Este mal que se verifica tanto a partir do cidadão, como também a partir do
servidor público guia-nos a pensar que em Moçambique a corrupção faz parte da
cultura.
Lembando que a corrupção constitui um comportamento
desviante dos deveres formais de um papel público (eleito ou nomeado) motivado
por ganhos privados (pessoais, familiares, etc.) de riqueza ou status (Nye
1957). Como também é um abuso do poder em benefício individual (USAID, 2000).
E num Moçambique, com essa cultura de corrupção,
verifica-se que a cidadania e os direitos humanos estão em posição
inferiorizada, isto é, a corrupção invade cada vez mais os espaços públicos e
coloca em questão a cidadania e os direitos humanos. Mas esta invasão, por
vezes é, da iniciativa do cidadão, este que esquece que em outros espaços
públicos pode também ser vitima deste ciclo vicioso. Desta forma, há uma
necessidade de consciencializar os cidadãos, bem como os servidores públicos
que a corrupção enferruja Moçambique, compromete o seu futuro e materializa as
mentes, capitalizando-as. Ferre os princípios éticos e morais da sociedade moçambicana.
Considerações
finais
Através desta relação designada de tríade dos
conceitos cidadania moçambicana, cultura de corrupção e direitos humanos, se
pode afiançar que em Moçambique, há cidadãos que minam a sua Cidadania e os
direitos humanos, pois que imbuídos do espírito capitalista hoje, agem em conformidade
com um status social, que
desconfigura a natureza duma sociedade que respeita a essência dum serviço público,
bem como a dignidade do outro ser moçambicano.
Numa relação prática desta tríade pode-se constatar
que a não consideração da real cidadania e dos direitos humanos em Moçambique,
cria condições para que haja cultura de corrupção, consistindo na sobreposição,
inferiorização de moçambicanos sem poder nem status social elevado a partir de outros moçambicanos, em prol de
favoritismo, nepotismo, clientelismo, etc. Com isso pretende se chegar a conclusão
de que em Moçambique existem servidores públicos com um nível de cidadania que,
sociologicamente analisada, não deveria fazer parte do quadro de servidores,
pois que servidores públicos no verdadeiro sentido estão para servir o público
em primeiro lugar, e não para molhar a mesa nem para instar que haja algum
valor no nó da capulana nas maternidades.
Assim sendo, em Moçambique a cultura de corrupção
tem sido herdada desde as elites e iconografias políticas corruptas até ao
simples cidadão, este último que viola subjectivamente os seus direitos humanos
quando se prepara material ou monetariamente para pedir um favor a um servidor público.
E para fazer face a esta cultura de corrupção a sociedade moçambicana através da
sua célula base deveria avançar com novas consciências, capazes de proporcionar
um Moçambique em que a Cidadania ganha na pratica o seu real sentido e que os
direitos humanos sejam compreendidos por todos de forma a serem defendidos e
promovidos.
Referências bibliográficas
COVRE,
Maria de Lourdes Manzini. O que é
cidadania. São Paulo: Brasiliense, 1991.
FUNARI,
Pedro Paulo. A cidadania entre os romanos.
In: PINSKY, Jaime e PINSKY, Carla
Bassanezi (orgs). História da Cidadania.
2ª Ed. São Paulo: Contexto, 2003.
NYE, Joseph. “Corruption and political development: a
cost-benefit analysis,” American Political Science Review, nº 61, 1957.
USAID/US AGENCY FOR INTERNATIONAL DEVELOPMENT. “A
handbook on fighting corruption”. s. 1. Washington, 1998. WORLD BANK. “Helping
countries combat corruption: the role of the World Bank”. Washington,
2000.
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